quinta-feira, 16 de abril de 2009

Nuances

A Páscoa passou e, inusitadamente, trouxe aquele sentimento de família à mim.
É verdade, ele é sempre presente. É algo do tipo que quando eu penso, eu nunca hesito, o pensamento é permanente: a família é a única que eu sempre vou contar e que eu não fico na dúvida se é amor. É amor. Família é sinônimo de amor.
Isso me foi instituído desde criança. Sempre me fizeram perceber isso e, bem, eu comprovei nos mais singelos atos.
O problema é que passei a ter tanta certeza no sentimento da família que desviei o foco nos outros tipos de relacionamentos. Ah, quanto a esses... eu sempre tô em dúvida. Até porque eu também sempre me mostro em dúvida aos outros. Eu me vejo metarfoseando o tempo todo o que eu sinto perante as pessoas e sei que como eu, elas são capazes do mesmo. Então, passo a duvidar o tempo todo, pois sei que também sou duvidável.
Isso é muito agoniante, porque há aquela vontade infinda de querer ter certeza do que o outro tá sentindo. Mas o outro sempre vai ser um enigma e o jeito é continuar jogando com os seus nuances.
Esse tipo de coisa eu pude metaforizar no joguinho de toda Páscoa.
Eu nem gosto muito de chocolate. É algo que eu não faço questão (e olha que eu faço questão de muitas comidas). Mas, toda Páscoa, eu insisto pra mamãe comprar ovos da Páscoa pra mim e pros meus irmãos e escondê-los no domingo do feriado para acharmos e lermos a mensagem que ela escreveu.
Quando criança, eu, costumeiramente, era a última a achar o meu ovo e teve uma vez que eu não consegui achar de jeito nenhum. Chorei, claro, era uma criança. Minha mãe me mostrou onde estava. Um lugar um pouco mais alto do esperado (pendurado no ar condicionado), totalmente perceptível, era só olhar um pouco mais pro alto, mas eu não tinha conseguido enxergar.
A partir daí comecei a me empenhar ao máximo a cada ano que passava. Sem muito sucesso. Conseguia achar mas não era a primeira a conseguí-lo. E os lugares não eram tão óbvios assim, mas eram completamente visíveis. Era normal eu ficar impressionada por ter passado muitas vezes perto do esconderijo e não ter reparado.
Esse ano eu fui a primeira a achar o ovo. Aconteceu o de sempre... demorei um pouco, passei várias vezes pelo esconderijo, mas acabei achando primeiro que os meus irmãos. Nada de especial aconteceu. Eu não aprendi novas técnicas de achar ovos de Páscoa e nem espionei a minha mãe pra ver onde ela escondia. Apenas aconteceu.
E daí que vem a metáfora. Suponhamos que o que o outro sente seja o ovo. Não é que a gente não tenha entendimento sobre como encontrar esse sentimento, identificá-lo e alimentarmo-nos dele. É apenas algo que depende das circunstâncias da vida.
Eu não fiz nada de especial pra encontrar o ovo da Páscoa, apenas procurei e achei, apesar de que passei despercebida por ele várias vezes. Assim acontece com o "sentir" do outro. São emitidos sinais, há toda uma formação discursiva por trás do que ele fala, mas nós passamos despercebidos. Eu passo despercebida. E, de repente, com nada planejado ou pressentido, há o momento que há a revelação. Sem mais nem menos. Nuances.
Talvez nem o sentimento da família seja definitivo e perceptível o tempo todo. É que ele é apenas de convivência tão íntima e repetitiva que torna-se fácil enxergá-lo melhor.
Ainda bem que eu o enxergo e não preciso pedir pra alguém me direcionar pra me mostrar onde ele está. O sentimento tá sempre ali. Pode ser que ele seja o que eu precise pra me direcionar à segurança do sentimento dos outros. Pode ser... vamo ver.

quinta-feira, 9 de abril de 2009

No leito.

Eu não falo na luz do fim do túnel.
Falo de olhares que se encontram, formando um só caminho de luz.
Por que as pessoas confudem aquela idéia de morte com a visão de uma luz no fim do túnel?
A verdade é que não existe túnel!
Eu estou morrendo e nunca houve túnel.
Túnel é arredondado, sem declinações e deslances.
Minha vida nunca foi um túnel.
Minha vida sempre foi como é agora, uma janela que, ora se manifesta como abertura, liberdade, ora se manifesta como grade, prisão.
Quando falo do encontro dos olhares, a janela continua se manifestando como duas. Pode ser aquela luz irradiante, metaforizando vida e sensação boa. Mas também... ah, também representa uma luz que cega, que sufoca, que quer se livrar do olhar do outro.
Nessa segunda visão, eu geralmente me vejo possuindo do outro olhar e assim, deixando de ter o meu.
Pela minha saúde de volta, eu não posso perder a única coisa que dizem ser o meu encanto! Eu preciso de um encanto pra poder morrer em paz!
Pra que, pelo menos, no meu último adeus, quando forem se despedir de mim, despeçam-se olhando fixamente pros meus olhos fechados lembrando de quanta vida já existiu ali. Vida que irradia, metaforiza vida e sensação boa. Não quero vida grande, vida prisão. Quero não.